Lanternas “mágicas” também no cinema

Lanterna De Projecao Inicio Do Nosso Cinema
Foto: Lanterna de projeção, início do nosso cinema.

Sobre o período junino de então – as luzes das fogueiras, os balões, fogos de artifício… –, tentei construir uma relação direta desse momento com o cinema. Motivo esse essencial de minhas habituais reflexões domingueiras, aos quantos me dão o privilégio de sua atenção e leitura. Não terá sido fácil juntar as duas peças: festa junina e cinema numa mesma lógica narrativa. Se não fora a oportuna sugestão de minha filha Alexandra, ao afirmar: “Papai, fale de lanternas!”. Captei de pronto a sua ideia e busquei refletir sobre.

Mas, como estabelecer a relação direta entre um e outro significado da “lanterna”, ligando-a ao Cinema? Foi aí que imaginei o vínculo simbólico existente, contudo, em instantes completamente distintos; não tão distintos assim: às memórias de minha infância, quando mergulhava em fantasias indescritíveis ao pendurar balões e lanternas na porta da minha casa, sob o olhar vigilante de minha saudosa mãe, Dona Neném, em Santa Rita, sentindo o cheiro da lenha queimando na fogueira de São João e dos foguetões na frente de casa, em noites úmidas e orvalhadas pela chuva fina.

Imaginei, enfim, as cenografias “lanternadas” dos filmes sobre o Japão medieval, que sempre exibia, e aí está o Cinema, sobre as caixas de luz a carvão (“lanternas”) construídas com chapas de ferro pelo meu pai, com a minha pueril ajuda, para a projeção fílmica em nosso cinema (também de nome São João). Por fim, as lanternas chinesas de “Adeus Minha Concubina”, simbólico filme daqueles tempos, que me lembram uma das mais belas alegorias cinematográficas orientais.

Quanto a esse filme de “lanternas mágicas”, depois de todos esses anos, jamais esqueci. Trata-se de um romance entre dois homens e uma prostituta ao longo de meio século, filme que venceu o Festival de Cannes de 1993. A estória se passa na primeira metade do século passado, quando dois amigos se tornam célebres ao interpretar a ópera “Adeus minha Concubina”. É a saga do rei Chu, guerreiro que liberta sua amante Yu, na véspera de uma derrota. Depois, para não o abandonar, ela se suicida. A cena é chocante! O recinto palaciano, onde reside o rei Chu e sua concubina é totalmente revestido de lanternas coloridas, propiciando uma atmosfera mágica à cenografia do filme, que faz um retrato dos momentos políticos dramáticos vividos pela China, utilizando alegorias de um teatro de ópera marcado por vários códigos estéticos. Nesses códigos estéticos, bastante expressivas estariam as “lanternas”, que de chinesas passaram a ser, também, os códigos visuais de minhas memórias de infância, durante as festas juninas.


Sob curadoria da Academia Paraibana de Cinema, representada por seus integrantes Umbelino Brasil, Romero Azevedo e João de Lima Gomes (presidente da APC), o filme “Memórias e Utopias”, do diretor Eduardo Donato foi recentemente lançado em Campina Grande, na UFCG, e em João pessoa na UFPB.

A obra está agora disponível no canal do You Tube e registra com bastante destaque a missão do cineclube Silvio Tendler, que opera de modo físico e remoto desde 2019 a ONG Café Cultura de Santa Luzia.