“Cinema verdade” inexiste em absoluto

Foto: Linduarte Noronha, sempre filmou fragmentos da uma realidade.

Houve um tempo seriamente peculiar no cinema paraibano, criado por uma geração considerada “documentarista”. Esse período terá sido o mais ativo entre as décadas de 1960 e 1970, basicamente, da qual também fiz parte. Foi uma fase, como dissera o eloquente Glauber Rocha, de se portar “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça”. Isso, sem nenhuma pretensão de ser indústria de cinema. Experiências que serviram para sedimentar, não apenas na Paraíba, as bases do Cinema Novo no Brasil.

Só que, cooptados por essa máxima glauberiana, alguns realizadores da época se autonomearam (e ainda hoje são rotulados como tal) precursores de um “cinema verdade”. E que o cinema documental seria a “veracidade dos fatos” então flagrados por uma câmera.

Mesmo tendo iniciado como documentarista naqueles tempos, jamais concordei com essa acepção de “cinema verdade”. Sempre discordei de tal rótulo, e até escrevi várias vezes sobre, aqui mesmo nas domingueiras de A União, também em livros que publiquei, explicando os motivos da recusa. 

Na realidade, a “verdade” absoluta de quaisquer ocorrências, que sejam registradas documentalmente pelo cinema (ou por simples audiovisual) – os espaços, pessoas e suas ações – não existe de fato. Isso porque, a Verdade transcende aos limites de um simples enquadramento de câmera. O portador de “uma câmera na mão” (ou mesmo em um tripé), detém apenas espaço e tempo limitados de determinada ocorrência. Apreende, sim, parte apenas circunstanciada pelos limites visuais angulares de uma câmera. Técnica essa que limita a totalidade do que realmente está acontecendo naquele momento. Mais ainda, quando o produto dessa filmagem (ou gravação de imagens) vai demandar uma “decupagem”. Isto é, ao final, seleção e junção das imagens captadas para formar o que chamo de “nexo narrativo”.

Teses como essas defendi na Universidade de Brasília, quando do meu Mestrado em Comunicação e Cultura Contemporânea. Textos que transcrevi em livro intitulado “Cinema e Televisão: Uma relação antropofágica”, editado pela Editora A União, em 2002, cuja edição está esgotada.

A questão aqui então colocada, se não me engando, me remete aos anos de 1990, quando de encontro que tive com os cineastas Carlos Diegues (Cacá) e José Carlos Avelar, durante um dos festivais de Brasília. Naquela ocasião, indaguei a ambos sobre questão do “cinema verdade”, a partir do que entendo como cinema, sendo “a arte da representação de uma realidade”; documental ou ficção. Os dois foram unânimes em concordar com a “representação”.

Para Avelar, inclusive, em se tratando de cinema, tudo não passa de uma grande ilusão. Mesmo sob uma “visão realista” dos fatos. E afirma: “O que me parece importante destacar é que o cinema tentou estabelece desde o início, um tipo de sensação de impacto”. E dá exemplos como o da chegada do trem à Gare de Lion, na França, no filme dos Irmãos Lumière. A questão, enfim, transcende à mera categoria em cinema; se é ficção ou documentário. Fato é que, essa história de “cinema verdade”, a rigor, inexiste.


APC: Patrono Linduarte é homenageado

“ARUANDA – Tributo à Linduarte Noronha” foi realizado na terça-feira passada, na Sala de Reuniões do CCTA da Universidade Federal da Paraíba, no Campus I de João Pessoa. Professores da UFPB e integrantes da Academia Paraibana de Cinema discorreram sobre a importância do cineasta paraibano e sua principal obra Aruanda. As atividades aconteceram durante o dia todo.

O cineasta Linduarte Noronha, autor de Aruanda e Cajueiro Nordestino, é Patrono da Cadeira 01 da APC, que tem como Ocupante o professor Cláudio Brito, do Instituto Federal de Educação.