Cinema, fábrica de gelo e DOI-Codi

Foto: De DOI-Coddi, em 1964, ao atual Centro de Artes.

Nos meus dez anos de idade até a juventude, se não falha a memória, a Rua São Miguel da Praça da Pedra, sempre foi a minha segunda residência. Próximo da casa de meus tios Oliveira e Lica, ele influente “guarda livros” (Contador) dos comerciantes da Rua da República, ficava o Cine São Pedro. Esse era realmente o templo de meus sonhos de criança, dos meus super-heróis, bem como as Lojas 4.400, na Avenida Beaurepaire Rohan. E mesmo morando em Santa Rita, vivendo as fantasias nos cinemas de meu pai, sempre passava temporadas na casa dos meus tios em João Pessoa.

Por vezes, conseguia tomar o bonde com tia Lica, indo para os lados da praia, numa longa avenida arborizada, hoje de nome Epitácio Pessoa, e sobre a qual o meu pai Alexandre havia comentado, sobre a época em que havia ali trabalhado com seu tio Antonio Gonçalves, “… que era uma região pouco ou quase nada habitada, mas que ligava o centro da cidade à praia de Tambaú”. E foi numa dessas idas com a minha tia, rumo à praia, que ouvi pela primeira vez uma melodia de piano que vinha de uma mansão, sob intensa vegetação, que jamais esqueci.  Só com o passar dos anos, soube realmente o título e de quem era a bela composição – “Por Elisa”, de Beethoven, música que usei como uma das trilhas sonoras em Antomarchi, nosso audiovisual premiado pela Academia Paraibana de Cinema.

Mas, com referência ao título deste artigo, como parte de nossa história, diria da importância que tem o prédio da recém inaugurada Escola Integral Técnica de Arte, no Varadouro. No passado de minha adolescência, um centro pavoroso de tortura e perseguição, que foi o DOI-Codi, na Ditadura Militar, que era o nosso tormento, enquanto estudantes e ativistas culturais em Santa Rita. Inclusive, onde ficou preso o meu primo Reginaldo Antônio de Oliveira (depois Juiz de Direito), após ser transferido do 15 RI de Cruz das Armas.

Pois bem. Entre o antigo prédio da ditadura (hoje de Arte) com a Rua da República, na esquina ficava o Cine Astória, e logo pegado a este existia uma fábrica de gelo do Sr. Diogo Braz. Que, aliás, foi sócio de meu pai Alexandre na construção do seu primeiro cinema em Santa Rita – o São Braz. Parceria que durou alguns anos, mas a pedido amigável do Sr. Braz, meu pai comprou a parte dele, dando início a mais três cinemas. Salas construídas no bairro das Populares, outra no centro da cidade e uma no distrito de Várzea Nova.

Na época, ainda muito jovem e residindo na São Miguel, tanto os cinemas São Pedro e Astória, que sempre frequentava, e a fábrica de gelo eram para mim pontos de interesse juvenil. Menos o antigo prédio do DOI-Codi, que diziam ser onde se torturavam as pessoas. E hoje, toda vez que lembro da prisão do primo Reginaldo pelos militares, em 1964, vem à mente o atentado que ele sofreu como juiz da Comarca de Itabaiana, quase meio século depois. Assunto sobre o qual escrevi na semana passada.  E parodiando o grande escritor francês Victor Hugo – “Quem abre uma escola fecha uma prisão” –, afirmo que, bem posta foi a ideia de se construir a Escola Integral Técnica de Arte, justo no local de uma Central de Polícia. O que significa, escolarizando a juventude em detrimento da criminalidade.


UFPB exibe “Américo – Falcão Peregrino”

Criado a partir de reunião da Academia Paraibana de Cinema, o projeto “Prata da Casa” coordenado pelo professor João de Lima, vice-presidente da APC, deve ter prosseguimento na próxima quinta-feira, às 11 horas, no Cine Aruanda, com a participação dos professores e alunos dos cursos de Cinema e Audiovisual da UFPB.

A obra a ser exibida nesse dia será Américo – Falcão Peregrino, direção de Alex Santos, membro da Academia de Cinema, a partir de argumento seu e do Dr. Manoel Jaime Xavier, também da APC, sobre a vida do poeta Américo Falcão, de Lucena. A música é Adeildo Vieira. Após a exibição haverá debate com os realizadores, sob a coordenação do prof. João de Lima.